A quem interessa o fim dos serviços públicos?

Por Augusto Bernardo *

A população é bombardeada com comentários depreciativos acerca dos servidores públicos e dos serviços públicos. Posicionamentos orquestrados por políticos, empresários, mercado financeiro e imprensa tentam incutir na sociedade a ideia de que os serviços públicos não prestam e que os trabalhadores públicos trabalham pouco e ganham muito.

Atente para as tantas reportagens veiculadas nacionalmente, principalmente nas chamadas redes “News”, quando comentaristas falam sempre a mesma coisa, seguindo um script previamente combinado. Os convidados a opinar defendem a mesma coisa, batendo sempre e sem haver o contraponto dos servidores ou dos seus representantes.

Mentiras estão sendo repassadas, grudando nas pessoas como sendo informações verdadeiras. Claro que isso soa bem para quem não conseguiu passar num concurso público ou para quem está desempregado. E assim o caminho fica aberto para que políticos consigam trocar livremente servidores concursados por cabos eleitorais.

A reforma administrativa esconde as novas armadilhas usadas para desmontar a contratação por mérito e facilitar o aparelhamento da máquina pública por pessoas e empresas com outros interesses. As empresas terceirizadas, por exemplo, devem estar esfregando as mãos, pois ganham muito para fornecer trabalhadores mal remunerados.

Dentre as mentiras está a de que o Brasil possui muitos servidores públicos.

Em levantamento feito pela OCDE, de 30 países analisados, o Brasil foi apenas o 26º no tamanho do serviço público. Temos apenas 12% da população ocupada trabalhando no serviço público, número menor que o de países como Reino Unido (23,5%), África do Sul (17%) e Portugal (16%).

Outra, que todo servidor ganha muito. A mídia às vezes distorce os dados mostrando exemplos de salários exorbitantes como se fossem a regra. A verdade é que, dos servidores do Poder Executivo, metade ganha menos que R$ 2.589, e a grande maioria (75%) ganha menos que R$4.621. Os salários mais elevados estão no Poder Judiciário e no Poder Legislativo.

Quando se lê que servidores públicos ganham mais do que no setor privado, com informações distorcidas, geralmente se compara o salário médio dos servidores públicos com o salário médio da população ocupada, mas essa comparação não é honesta. O serviço público, por se basear em concursos, tem uma quantidade maior de trabalhadores com ensino superior (49%, ante 18,5% da população geral) e com ensino médio. A comparação precisa ser feita com os salários pagos a trabalhadores mais qualificados. A média do trabalhador brasileiro com ensino superior é de R$4.997, enquanto a média salarial dos servidores públicos é até menor, de R$ 4.205.

As despesas com pessoal e encargos da União se encontram hoje no mesmo patamar de vinte anos atrás (4,4% do PIB), como mostra o Atlas do Estado Brasileiro, do IPEA. Esse valor chegou, inclusive, a ser menor de 2014 a 2016, no auge da crise. Além disso, as despesas com servidores ativos federais representam apenas ¼ da receita líquida da União.

Outra inverdade é a de que servidores têm reajuste automático. Essa vem sendo contada pelo ministro que disse que o dólar caro é bom porque antes as domésticas estavam viajando para a Disney. Como em qualquer atividade, os trabalhadores do setor público podem pedir aumento, mas o patrão não é obrigado a dar.

Desde a EC 41/2003, os trabalhadores que ingressam no serviço público não possuem direito à aposentadoria integral. Eles contribuem sobre seus salários e só podem receber até o limite dos benefícios pagos no regime geral da previdência.

Sobre a estabilidade, pelos termos da Lei 8.112, os servidores precisam ser avaliados por três anos (estágio probatório) e também podem ser demitidos. A estabilidade no serviço público serve para impedir que os políticos que ocupam cargos de chefia chantageiem seus subordinados com ameaça de demissão.

Por fim, o enfraquecimento do serviço público não vai beneficiar em nada a população que não pode pagar por educação, saúde, segurança e demais serviços. O valor “economizado” com a redução de 25% nos salários só será benéfico para os fundos partidários e emendas parlamentares, para as empresas interessadas em lucrar em cima do governo e bancos recebedores de juros astronômicos da dívida pública brasileira.


Fonte: Jornal do Commercio
*Augusto Bernardo Cecílio é auditor fiscal e professor

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